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9 de setembro de 2016
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Após cura do câncer, Lourdes escreve livro com a história de sua família[/caption]
Uma caderneta de padaria, daquelas que existiam antigamente, nas quais se marcava os produtos que comprava para pagar no fim do mês, acabou virando livro. Era um antigo sonho da gaúcha Lourdes Gresele, 49 anos, que só depois do câncer percebeu que podia transformar um simples caderninho contendo valiosas anotações em uma publicação com a história de sua família. “O câncer mudou meu modo de pensar. Como decorrência da doença passei a notar que as coisas simples da vida podem nos trazer felicidade. Jamais imaginei que uma caderneta, na qual eu anotava, dentre outras informações, o nome e a data de nascimento de primos, irmãos e tios, pudesse virar um livro”, declarou a paciente do Hospital Amaral Carvalho (HAC), o Hospital do Câncer do Brasil.Há quatro anos, numa quarta-feira de cinzas, Lourdes foi diagnosticada ser portadora de leucemia. “Era véspera de carnaval. Eu estava saindo do trabalho, quando senti uma confusão mental. Passei mal naquele feriado e acabei ficando internada para exames. Foi quando recebi a noticia que mudou a minha vida”, recordou.Foram 32 intensos dias de tratamento quimioterápico. Lourdes contou com o apoio incondicional de Djalma Dau, seu atual marido. “Ele ficou ao meu lado o tempo todo, me dando forças. Estamos juntos desde que meus filhos eram pequenos, mas nunca pensei que fosse tão amada por ele”, disse. Transplante de medula ósseaDe fevereiro até outubro de 2012 o tratamento fluiu bem, mas a doença não deu tréguas. Lourdes foi, então, encaminhada ao Hospital Amaral Carvalho, em Jaú, interior paulista, para se submeter a um transplante de medula, sua chance de sobreviver. O hospital é referência no Brasil nessa especialidade. Entre seus oito irmãos que fizeram o teste de compatibilidade para doar a medula, dois possuíam a mesma carga genética. “Meu irmão Danilo, com quem eu menos tinha contato, foi o selecionado. Tinha 14 anos quando saí de casa e não convivemos mais. O câncer me aproximou dele novamente”, comemorou.O transplante foi realizado em novembro de 2012. O procedimento foi um sucesso, mas com a cura do câncer vieram também algumas sequelas que transformaram a vida da gaúcha de Ilópolis, a cidade da erva mate. “Sempre fui uma pessoa ativa, acelerada. Adorava correr, jogar bola, mas hoje tenho limitações com as quais me adaptei para conviver com a nova realidade. Não voltei a trabalhar, vez que contraindicado a presença em locais aglomerados. Uso a máscara o tempo todo, enfim, sendo necessário desenvolver novos padrões de vida”, confessou. A doença requer alguns cuidados especiais em sua vida, mas ainda assim ela diz ser grata a Deus por estar passando por essa experiência. “Hoje, faço artesanato, leio livros, assisto TV, e tantas outras coisas que não fazia antes. Se eu não tivesse tido essa moléstia, estaria trabalhando até hoje como um robozinho e não teria aprendido a ver o mundo com novas lentes”, avaliou.
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Lourdes Gresele, durante o tratamento em 2012[/caption]
LivroA psicoterapia teve papel fundamental para Lourdes superar os efeitos do câncer. Há três anos ela faz acompanhamento com uma psicóloga do Amaral Carvalho. “A terapia me ajudou a perceber a vida de outra maneira, a prestar mais atenção nas pessoas e às coisas à minha volta. Foi quando peguei novamente a minha cadernetinha, que eu tinha desde os sete anos de idade, para reviver aqueles momentos da minha infância”, contou.Lourdes contatou, então, cada um de seus oito irmãos e seu pai, pedindo que relembrassem fatos importantes da época. “Depois que consegui reunir o relato de todos, juntei esse material às minhas anotações. Pesquisei também a história de vida do meu bisavô, que veio para o Brasil de navio, da Itália, em 1865. E então, após dois anos de dedicação ao meu propósito, consegui concluir o livro e presentear cada membro de minha família”, contou emocionada.Depois do transplante, Lourdes não viu mais o pai. Eles se falavam pelo telefone, mas Seu Redozino Greselle (grafado com dois L – diferente do dela) dizia para a filha que viajasse para visitá-lo só mesmo quando ela estivesse bem disposta. Ele vivia em Ilópolis, cidade de origem de toda a família, e ela em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, para onde se mudou logo após seu primeiro casamento. “Meu pai se preocupava muito comigo. Dizia que uma viagem ao Rio Grande do Sul seria muito longa e eu deveria me poupar”. O peso da saudade aumentou quando, em fevereiro deste ano, Seu Redozino, aos 87 anos, faleceu. “Naquela fase da minha vida foi muito difícil aceitar o fato. Eu já havia perdido minha mãe para um câncer e era muito ligada a meu pai, mas uma coisa me consola: eu sabia que ele estava feliz. A minha cura e o livro da nossa família foram os maiores presentes que eu podia ter lhe dado em vida”. Lourdes, que voltou para Campo Grande para perto dos filhos Henrique e Herbert, está à espera de um novo sol em suas vidas. Talita, sua filha mais velha que vive em Santa Catarina, dará à luz Oliver ou Kali, em fevereiro de 2017. “Estou curtindo muito a ideia de ser avó”, sorriu a gaúcha.Em tempo: Lourdes Gresele nos contou que já começou a rascunhar uma nova história em uma outra caderneta de padaria. “Quando eu fizer 50 anos, publicarei um livro sobre minha vida após o câncer. Quero poder dividir com as pessoas todas as bênçãos advindas com a adversidade. Quando realizar este sonho, estarei completamente feliz”, concluiu.
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Lourdes, em seu retorno ao Amaral Carvalho, há duas semanas[/caption]

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